Ele, ela e os xis, vulgo x, para distinguir plurais masculinos, femininos e afins no decorrer do texto, estejam avisadxs desde já. O delegado e a cabeleireira, salto-quantistas espiritualistas, LGBT´s, desbocadxs, socialistas e quarentões. A reportagem do CINFORM conversou com Mário Leony e Linda Brasil, pré-candidatxs a federal e estadual nas eleições de 2018 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSol-SE).

A campainha toca às 9h20 de quarta-feira, somos acolhidos por Milk com a regimental hospitalidade canina. O shitzu simpático que habita o mesmo teto de Mário e Serginho rende homenagem a Harvey Milk, militante LGBT e parlamentar californiano assassinado em 1978, que teve a cinebiografia estrelada por Sean Penn em “Milk, a voz da igualdade”, lançado em 2008. Linda Brasil ainda estava a caminho e não havia tempo a perder: gravador ligado e pé na tábua.

“Vixe, pere que se eu sair na foto sem aliança Serginho me mata”, corre Mário em direção ao quarto, enquanto somos monitorados por Sivuca, o gato persa soberano da mesa que guarda nossa entrevista. Mário de Carvalho Leony é “bagipano” – baiano de Salvador radicado por estas bandas – cidadão aracajuano desde 2012, tem 43 anos de idade, 16 de Polícia Civil e mais de uma década de casamento e companheirismo com o arquiteto Sérgio Fernandes, oficializado em cartório em 2015. “No mesmo ano em que assumi publicamente minha homossexualidade e minha militância eu encontrei Serginho, me assumi em março e na parada LGBT, em 19 de agosto, a gente se conheceu. Foi um presente que o movimento me deu”, afirma de bate-pronto o homem que temia a solidão causada pela exposição pública em um estado eivado de raízes colonialistas e patriarcais.

O DELEGADO FORA DO ARMÁRIO

Mário Leony é membro da Rede Nacional de Operadores da Segurança Pública LGBT (Foto: Vieira Neto)

“No começo da minha carreira eu tive depressão, porque parti pra uma auto cobrança pra ser um delegado de estilo truculento, isso me fazia crer que eu não era vocacionado para o cargo. Isso é parte da cultura organizacional violenta da segurança pública”. Sempre lotado na Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e na Corregedoria da Polícia Civil, ele sai em busca de referências para outra concepção de Segurança Pública, quando assumiu publicamente sua homossexualidade em 2007, durante um seminário da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp).

Mário é um dos fundadores da Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBT, a Renosp, órgão criado para enfrentar a LGBTfobia institucional na área, tais como: óbices na promoção das carreiras, assédio moral, remoções arbitrárias, processos administrativos disciplinares motivados por LGBTfobia, dentre outras questões. Ele destaca a necessidade de debater especificamente a Polícia Militar. “O policial militar é aviltado na sua cidadania, militar não tem direito a voz, sobretudo os praças. Por isso é fundamental avançarmos no debate da desmilitarização da PM”, afirma.

NÃO ME FOI DITO “ SEU VIADO, SAIA DA POLÍCIA CIVIL!”

Mário recorda um caso emblemático no início de carreira que marcou sua trajetória quando fora lotado na Delegacia do Santa Maria. O recinto era tratado como a “delegacia do castigo”: não havia nenhuma estrutura, comunidade frágil, dentre outras questões. “Não me foi dito “seu viado, saia da Polícia Civil”, mas a minha lotação para lá teve este sentimento. Levei a situação ao meu superior na época, ele virou pra mim e disse. “Você quer saber quando você começa a se impor? Quando você derrubar o primeiro lá, o primeiro vagabundo. Pra isso não falta vela e arma.”

TRANSFORMAR É PRECISO

Linda Brasil é organizadora da CasAmor (Foto: Vieira Neto)

Aos 35 minutos de conversa o interfone toca: Linda Brasil está subindo. Apressada e esbaforida, segue teleguiada em direção à parede espelhada para arrumar o cabelo. “É péssimo estacionar aqui perto”, desabafa. Linda Brasil completou 45 anos no dia 13 de abril, é cabeleireira e mestranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Natural de Santa Rosa de Lima, do povoado Canabrava, é a mais nova de sete filhxs. Migrou para a capital em 1985 para fazer o ensino médio no Colégio Estadual Castelo Branco. “Maior alegria é passar na porta daquele colégio e ver que o nome daquele ditador foi tirado de lá. Paulo Freire, olha que diferença”, bradou Linda, ao comentar a mudança do nome do colégio ocorrida em 2016.

O bullying e a LGBTfobia, ainda sem nome naquele momento, a fizeram trocar de escola. “Meus irmãos, querendo me proteger, me trocaram de escola e fui estudar no Pio Décimo. Eu já sofria naquele tempo, mas não sabia que nome tinha aquilo. A gente não tinha a quem recorrer”, afirmou. Concluído o curso técnico em Contabilidade, Linda trabalhava na área e fazia shows transformistas no final de semana. “Era uma forma de fuga, uma brincadeira, uma forma de experimentar outra identidade também”.

O CORPO É UM PANFLETO

Mário, Linda e Serginho no lançamento das pré-candidaturas, no dia 23 de março

Seu processo de transição de gênero foi longo, processual e trouxe um conflito inicial: ao optar pela transição de gênero seu trabalho em Contabilidade estaria comprometido. Mas Linda seguiu em frente com a decisão: fez um acordo com a antiga empresa e abriu um salão denominado LINDA BRASIL, nome que viria a adotar em sua nova identidade. “A transição de gênero não acontece do dia pra noite, você não vira pro seu R.G e pronto, este aqui não sou eu. Você vai testemunhando amigas passarem pela transição, pelo tratamento hormonal, pelas cirurgias, e vai se envolvendo também. Algumas pessoas sentem necessidade de fazer a transição e outras não, eu tive”, afirma Linda.

“Só a presença física da pessoa trans já é a sua própria militância. A partir do momento em que nossos corpos são vistos, já é uma bandeira de militância. O medo da exposição, de sair na rua, é uma constante que precisamos superar.”  Ela entrou no curso de Letras Francês da UFS em 2013, quando teve contato com parte da militância LGBT a partir do grupo Desmontadxs. A partir da Marcha das Vadias, participaria do Coletivo de Mulheres de Aracaju e outros espaços. “Conheci a perspectiva do Transfeminismo neste tempo, até então conhecia apenas uma parte do movimento LGBT que pautava apenas a prevenção da DST/Aids, que é bem importante mas que não dá cabo da diversidade que o movimento engloba”. Atualmente Linda é organizadora da CasAmor, casa de acolhimento a LGBT´s em Aracaju, e uma das organizadoras da Semana de Visibilidade Trans.

FILIADXS NO MESMO DIA

Eis que em meio a uma noite de 2014 Mário e Linda, que já eram parceiros do Salto Quântico – instituto espiritualista liderado pelo médium Benjamin Teixeira – se encontraram na porta do PSol-SE para uma apresentação coletiva do partido. “A gente já era irmão salto-quantista, agora assinaríamos a ficha no mesmo dia e nem havíamos conversados sobre isso”, afirma Mário. A influência do trabalho de parlamentares como Jean Wyllys, Marcelo Freixo, Henrique Vieira, além das campanhas locais, aproximaram os dois. “ A Luciana Genro tinha sido a primeira candidata a presidente a falar transfobia em cadeia nacional, a campanha da Sônia Meire tinha pautado a questão LGBT naquele ano, tudo isso nos aproximou do partido”, ressalta Linda.

Linda foi candidata a vereadora em 2016, quando obteve 2.308 votos e escapou do primeiro mandato em virtude da legenda. Mário nunca foi candidato e expressa o nervosismo de primeira viagem. Em 2018, seguirão em dobradinha: estadual e federal. “Agora é Mário e Linda, Linda e Mário. Em um momento de ataques, de avanço do conservadorismo, estamos colocando nossos nomes para esta batalha, independente do resultado das urnas. A gente está aí para o combate contra o conservadorismo e a direita”, afirmam.

 

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