O Ministério da Educação (MEC) divulgou, recentemente, o resultado do Censo do Ensino Superior 2022. Os dados, em linhas gerais, apresentam informações importantes da realidade e que servem para pautar as políticas públicas da área.
Entre os números apresentados, alguns chamam nossa atenção. Considerando as pessoas com idade entre 18 e 29 anos, nota-se que a desigualdade educacional é a marca no quesito percentual da população com ensino superior. Os 25% da população com maior renda tem 13,5 anos de estudos. Por outro lado, os 25% mais pobres da população têm apenas 10,3 anos.
O censo também revelou que diminuiu o número de participantes no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) entre os anos de 2018 e 2022, passando de 4,14 milhões para 2,39 milhões, ou seja, uma redução de 1,75 milhão de participantes em quatro anos. Por outro lado, no mesmo período, o número de matrículas na última etapa da educação básica saltou de 7,7 milhões para 7,86 milhões de matrículas.
Uma das hipóteses levantadas para a redução de inscritos é que muitos jovens estão desistindo de dar continuidade aos estudos após concluírem a educação básica. Um dos motivos, provavelmente, é a necessidade de trabalhar.
Agora, a informação que mais chamou a atenção foi o incremento significativo de ingressantes no ensino superior em cursos a distância (EaD). Para você ter uma ideia, em 2018, cerca de 1,37 milhão se dava através de cursos ofertados na modalidade EaD. Em 2022, esse número saltou para 3,1 milhões.
Se houve o crescimento no número de ingressantes em cursos EaD, a consequência direta foi o aumento no número de matrículas. Atualmente, há cerca de 9.443.597 estudantes matriculados em uma graduação. Desse total, 54% em cursos presenciais e os outros 46% em cursos EaD. Porém, mantido a taxa de crescimento dos últimos quatro anos, 2023 pode significar o ano da virada, ou seja, podemos chegar no final do ano com mais graduandos matriculados em cursos à distância.
O panorama dos cursos à distância se agrava mais quando detemos nosso olhar nos cursos que formam os futuros professores. Em 2022, cerca de 1,67 milhão de jovens estavam matriculados em cursos de licenciatura. Desse total, 64% em cursos EaD. Porém, enquanto 18,4% dos 571.929 matriculados em instituições
públicas de ensino superior estudam a distância, esse mesmo indicador alcança o percentual de 88% dos 1.097.982 matriculados nas instituições particulares.
O crescimento abrupto do ensino superior à distância nos últimos anos pode ter sido impulsionado por alguns fatores. O primeiro diz respeito ao avanço tecnológico. A popularização da internet banda larga, o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação (TDIC’s) e o advento da Inteligência Artificial (IA) favoreceram a expansão da Revolução 4.0 no campo educacional.
Outro fator que pode ser levado em consideração, e que guarda relação com o anterior, é que o uso da tecnologia tem contribuído com a redução dos custos operacionais de um curso superior. Consequentemente, no caso das instituições particulares, aumenta a possibilidade de ofertar cursos com valores mais acessíveis aos consumidores-estudantes, cada vez mais convencidos da importância de financiar a própria formação profissional.
Pode-se adicionar o fator pandemia que, embora demande estudos científicos mais refinados, acelerou a implantação da Revolução 4.0 no campo educacional. Aulas remotas, plataformas com conteúdos totalmente digitalizados, planos disponíveis em plataformas, provas online, aulas gravadas e tantos outros recursos foram adotados nos quase dois anos de pandemia, criando um novo normal no ensino superior.
Houve uma política deliberada do antigo governo para favorecer a expansão da educação à distância. Para citar um exemplo, o MEC chegou a publicar uma portaria autorizando a expansão do uso TDIC’s em cursos presenciais, podendo chegar a 40% da carga horária total de uma graduação.
Em suma, ninguém está aqui se opondo ao uso de tecnologias em atividades educacionais. O EaD é uma aliada importante para diminuir distâncias geográficas, possibilitando, entre outros, uma maior mobilidade acadêmica. Porém, o problema reside quando algo que era para ser utilizado em momentos específicos se torna em algo regular, perene. Se o Ministério da Educação e os demais órgãos competentes não intervirem logo, corre-se o risco de o ensino superior brasileiro virar, literalmente falando, em algo virtual. É isso que queremos?
Prof. Christian Lindberg
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