Vem dando muito o que falar o projeto de parceria público-privada (PPP) que a Prefeitura de Aracaju pretende implantar na área da saúde municipal. A empresa contratada terá prazo de execução de 25 anos e o valor global do contrato é de R$ 2,5 bilhões. Segundo a PMA, o objetivo é aumentar a capacidade e qualidade dos serviços prestados na Rede de Atenção Primária. Vários sindicatos que representam as categorias que atuam na administração pública de Aracaju contestam a forma como o projeto pretende gerenciar as regiões 1 e 2 de Saúde.

O secretário-geral do Sindicato dos Médicos de Sergipe (Sindimed), Dr João Augusto Alves de Oliveira, entende que o a PPP nada mais é que a privatização dos serviços da saúde de Aracaju. Para ele, é uma realidade sombria a saúde ser entregue à rede liberal e rede privada, que basicamente só visam o lucro. Algo como já acontece na rede municipal com a realização dos exames, que tem empresa contratada para a prestação do serviço à população, e a maternidade do Bairro 17 de Março.

“Eles vão dizer que é outro nome, mas é tudo privatizado, entregue ao mercado através de uma empresa. E é inevitável: toda empresa visa o lucro. Então, uma parte dos R$ 2,5 bilhões não vai ser investido na saúde, vai ser a parte do lucro da empresa. Isso é fato. Se a empresa não vai cobrar pelo atendimento, de alguma forma ela vai tirar o seu lucro do contrato. Se fosse pelo Sistema Único de Saúde (SUS) todo o dinheiro seria revertido para o sistema público. Neste caso não. É uma empresa que vai ofertar a assistência à população de forma global”, comenta.

Dr João Augusto Alves de Oliveira, secretário-geral do Sindimed

Segundo Dr João Augusto, a Prefeitura de Aracaju quer entregar todo o sistema de saúde, num primeiro momento das regiões 1 e 2, nas mãos da iniciativa privada. “Não é que o paciente vai ter acesso a rede privada via plano de saúde, como uma operadora. Não é isso. Será uma empresa que vai ser responsável pela assistência à saúde da população. Ou seja, a Prefeitura para de prestar assistência direta. De todas as formas, ela vai dizer para sociedade que qualquer problema que venha a surgir a culpa é da empresa, que ela não tem mais governança”, afirma Dr João.

O dirigente do Sindimed lembra que um dos maiores problemas enfrentados pelo sistema de saúde atualmente é a demora na marcação de exames, que, segundo ele, já é gerenciado pela rede privada. Essa dificuldade acaba gerando outro problema: o diagnóstico tardio. “É tardio justamente porque não se consegue exames, então tudo volta para o mesmo problema inicial que é a falta dos exames na rede pública de saúde”, disse Dr João Augusto, que é médico integrante da rede pública municipal de saúde há 17 anos.

Prejuízos para a sociedade e para os trabalhadores

A presidente do Sindicato dos Enfermeiros de Sergipe e Conselheira Nacional e Municipal de Saúde, Shirley Morales, tem a compreensão de que essa parceria público-privada traz prejuízos não só para os trabalhadores, como também para a sociedade em geral porque dificulta o acesso da população. Ela cita como exemplo o modelo de privatização da Unidade de Pequeno Porte (UPA) Nestor Piva, que era um hospital de pequeno porte e voltou a ser uma unidade menor, deixando de ser porta aberta.

“Não são todos os casos que podem ser referenciados para a UPA Nestor Piva, como antigamente. A gente tem queixa da população que chega ao Nestor Piva e sequer entra, nem fazem ficha, e muitos ainda são encaminhados para a unidade Fernando Franco que já sofre hoje com a sobrecarga no atendimento. Então, ele deixou de ser porta aberta e fazer parte dessa rede de referência de urgência e emergência, inclusive com queixas do próprio Samu que tem a dificuldade para transferir os pacientes para lá”, explica.

Shirley Morales, presidente do Sindicato dos Enfermeiros

No caso dos trabalhadores, Shirley ressalta que os servidores passaram por uma lista, alguns com anos de espera para estarem lotados nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), uma vez que tem a proximidade com suas casas. Os agentes comunitários de saúde, durante a seleção, têm que indicar que moram no local. É a solução de continuidade, porque é importante para comunidade ter o mesmo profissional integrante da equipe de saúde da família durante muitos anos no bairro.

“É o médico, o enfermeiro, o dentista, ou seja, é o agente da família. Então, com a PPP isso não teria mais, porque uma minuta de contrato tem a previsão de que a empresa que for vencedora da licitação pode terceirizar. Isso é prejuízo também. Tem também a questão da precarização do trabalho, a questão dos direitos trabalhistas que não teriam a responsabilidade solidária da Prefeitura. Então, isso geraria uma insegurança jurídica principalmente na direção do direito trabalhista. A transferência dos servidores para outras redes constitui desvio de função porque eles fizeram em concurso específico para saúde na rede de atenção primária, alguns especificamente para as equipes de saúde da família, e hoje as outras regiões não tem infraestrutura para suportar a vinda de todos esses profissionais”, complementa Shirley.

Ações na justiça

Os sindicatos estão se mobilizando para entrar ingressar com ações judiciais e encaminhando denúncia para o Ministério Público Estadual (MPE) e Tribunais de Contas da União e do Estado. Uma das primeiras medidas, considerada positiva pelos sindicatos, foi o pedido de suspensão do edital da PPP da Saúde por parte da Câmara Municipal de Aracaju. O Requerimento foi aprovado na última quinta-feira, 30, por 13 votos a cinco.

“Estamos em articulação com a Câmara de Vereadores para barrar esse processo, buscando o diálogo com o Conselho Municipal de Saúde para que faça as indagações necessárias a gestão já que este é órgão fiscalizador e deliberativo da saúde do município, estamos também dialogando com partidos políticos e mostrando as dificuldades e riscos que as  próximas gestões podem correr já que é um projeto de 25 anos , além das judicializações que cada entidade já está fazendo, também estamos  dialogando diretamente com a sociedade que é a parte mais interessada”, disse o presidente do Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde e de Combate as Endemias do município de Aracaju’, Carlos Augusto Santos da Conceição.

Carlos Augusto Santos da Conceição, presidente do Sacema

O que diz a Prefeitura

Através de nota, a Prefeitura de Aracaju lamenta a politização e precipitação negativa a respeito da Parceria Público-Privada da Saúde por parte de pessoas que desconhecem o projeto. A gestão municipal é a maior defensora do Sistema Único de Saúde e busca projetos para ampliar e melhorar a assistência ao usuário.

Ainda de acordo com a nota, a Prefeitura seguirá todas as recomendações legais de transparência e de debate sobre o tema no momento oportuno. “A gestão reforça, ainda, que preza pelo atendimento eficiente à população, a exemplo da terceira posição de Aracaju entre as cidades do Nordeste no desempenho no Previne Brasil, programa do Ministério da Saúde que mede a qualidade da Atenção Primária. Outro exemplo de prática resolutiva é a gerência do Nestor Piva. Só nos meses de janeiro e de fevereiro, já foram 24.729 mil atendimentos. E o que importa à administração municipal é eficiência e qualidade no atendimento de saúde da população”.

 

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