Na comunidade falta dinheiro até para fazer um simples cercamento, acarretando em vários problemas
Localizados na Ilha de São Pedro, no Município de Porto da Folha, os cerca de 450 índios xocós – reconhecidos pela Fundação Nacional do Índio – Funai – como a única comunidade indígena em Sergipe -, em pleno 2017, tentam manter viva as tradições, costumes dos seus antepassados a base de muito sacrifício, sem recursos financeiros, e ainda tendo que lidar, constantemente, com ataques, invasões dos “homens brancos”.
Quem revela este cenário atual é Lucimário Apolônio Lima, ou simplesmente Bá, 34 anos, cacique da aldeia xocó há 14 anos; e Desnival Diniz Botelho, chefe do Serviço de Gerenciamento Ambiental e Territorial Indígena da Funai – CR Nordeste, jurisdição do órgão federal que abrange comunidades indígenas de Sergipe, Alagoas, Pernambuco.
“Em 1993, conseguimos voltar para a nossa caiçara, a terra que nossos pais nasceram e se criaram, onde estão os pontos culturais
indígenas, local onde passamos mais de 150 anos sem poder dizer que éramos donos, pois fazendeiros tomaram conta. Mas, depois de muitas lutas, noites mal dormidas, conseguimos de volta. Só que não existe mais cercamento, arames para delimitá-la”, relata cacique Bá.
FUNAI SEM RECURSOS
Responsável proteger os indígenas e executar políticas públicas para tais, a Fundação do Índio sequer tem dinheiro para colocar cercas na aldeia xocó. “Seria competência da Funai fazer o cercamento. Mas os recursos alocados para o órgão têm sido muito tímidos, não conseguem atender as demandas das comunidades”, revela Desnival. Antes da crise econômica já existia contingenciamento e, hoje em dia, mais ainda.
Desnival aponta a importância do cercamento. “A gente só pode definir uma terra indígena se existirem limites territoriais, que é o fundamento de toda comunidade, já que eles vivem a base da exploração da agropecuária de subsistência. Os índios não são mais coletores e nem caçadores feitos índios do Centro-Oeste, Amazônia”, informa.
A falta de cerca permite a invasão de terceiros e acarretam em problemas com desmatamento e caça. “Até o nosso Ouricuri – espaço físico onde ensinamos as crianças e os jovens sobre a história e a luta do nosso povo – está sendo atingido; até o nosso ritual está sendo atingido pelos caçadores”, diz o cacique Bá.
LUTA ARMADA
Os xocós estão localizados numa mata, e, ao redor dela, não há mais vegetação, uma vez que os pequenos proprietários desmataram suas terras. “Só existe mata na região dos quilombolas e dos assentados que são nossos vizinhos e na nossa, que é cheia de tatu, peba, teiú, moco, veado, vários animais de caça”, afirma Bá.
Os índios já denunciaram as sucessivas invasões as suas terras ao Ibama, Ministério Público Federal, mas de pouco adianta. “É uma luta de tempo. Desde que voltamos para nossa terra existe esse ataque a nossa caça, mata, mas hoje é mais frequente, triplicou. Até gente de Alagoas vem para cá”, informa o cacique.
Bá não descarta, até mesmo, uma luta armada. “Eles têm certo temor com a gente, pois sabem que não somos brincadeira. Mas isso não é interessante. Não é justo que saíamos da nossa casa para enfrentá-los, a gente atirar neles e eles atirarem na gente. Nunca atiramos. Já ouvimos tiros dele no período de ritual”, revela o cacique.
VERBA VIA EDITAIS
A falta de cercamento não é o único problema dos xocós. “Eles exploram agricultura de subsistência e nem sempre têm apoio para isso,
haja vista que grande parte dos recursos que entram nas comunidades vem de políticas públicas. Não existem, por exemplo, linhas de crédito específica, como Banco do Nordeste, para suprir as necessidades”, informa Desnival Diniz.
Diante da escassez de recursos da Funai, os xocós buscam apoio de editais do Governo Federal, a exemplo da Agência Nacional de Águas – ANA -, por meio da construção de projetos. Para isso, se uniu a uma empresa de Consultoria de Projetos, a Conpetsan, e realizam reunião na última quinta-feira, 3.
“Nós que atuamos em projetos socioambientais, com conhecimento de editais, estamos vendo como poderíamos beneficiar a comunidade xocó, para que algumas políticas públicas cheguem naquela região. São 150 famílias que precisam de ajuda para sobreviver”, destaca Vera Cardoso, consultora especializada em Políticas Públicas da Conpetsan.