Doações de órgãos salvam vidas, mas ainda são pouco faladas entre famílias

Hoje, em Sergipe, 175 pacientes aguardam por um transplante de córnea e um pelo de coração. Os números são da Central de Transplantes, mas mostram apenas uma pequena parcela daqueles que aguardam por um transplante no Estado. Isso porque, desde 2012, os hospitais sergipanos deixaram de realizar transplantes de rim e hoje só estão autorizados a realizar dois tipos de transplante, o de córneas e o de coração.

Isso faz com que muitos pacientes busquem tratamento fora do estado, como é o caso de Davy Barbosa. Muitos pacientes não sabem qual doença causou a sua insuficiência renal crônica, e Davy é um deles. Devido a uma doença que atinge os ossos e articulações, ele, que fazia hemodiálise desde 2014, precisou ir para São Paulo realizar o transplante no ano passado.

Davy conheceu sua esposa durante o tratamento

“Eu precisei adiantar o processo do transplante porque eu estava desenvolvendo uma doença causada pelo aumento do hormônio da paratireoide (PTH). Eu não conseguia estalar os dedos ou correr porque sentia muitas dores nas articulações, foi aí que eu conversei com a minha família. Meu pai e meu irmão fizeram o exame de compatibilidade, os exames deram ‘negativo’. O que na verdade é bom porque significa que não há rejeição e eu acabei recebendo o rim do meu irmão”, comenta.

Dificuldade para doação

Hoje, cerca de 34 mil pessoas aguardam por um transplante no país e, segundo a enfermeira Ana Paula Rocha, é muito mais fácil nós entrarmos na fila de espera do que na de doadores. Mas, por falta de conhecimento, muitas famílias não autorizam a doação dos órgãos após a morte de um ente. Por isso, é importante que existam políticas públicas no país e nos estados voltadas para o processo de transplantes e doação de órgãos.

“Aqui em Sergipe, por exemplo, nós só temos transplantes de córneas e coração, sendo que nós já fizemos transplante de rim. E para que isso aconteça é necessário que os gestores invistam nisso e que a sociedade esteja envolvida nesse contexto. Até porque se a família não autorizar, não há transplante. E muitas vezes ela não aceita por falta de informação”, comenta.

A enfermeira ressalta ainda que para se tornar um doador de órgãos basta comunicar o seu desejo à família. “Para nós é muito difícil falar sobre a morte, mas nós precisamos falar porque ela é inevitável. Então é preciso conversar em família, manifestar o desejo de ser doador, porque é a família que autoriza ou não a doação dos órgãos”, explica.

Qualidade de vida

O transplante de um órgão, tecido, sangue ou medula pode não ser uma cura para quem recebe, mas lhes dá uma nova oportunidade e melhor qualidade de vida para quem recebe. Adriana Costa tem Lúpus há mais de quase 16 anos, uma doença autoimune que pode afetar articulações, pele, rins, células sanguíneas, cérebro, coração e pulmões.

Ao longo dos anos, Adriana sofreu muito com as crises da doença, de queda de cabelo a feridas na boca, passando por problemas psicológicos a rigidez muscular e inchaços. No final de 2010, ela já estava pesando 109 quilos e seus rins já haviam paralisado, mas sem qualquer diagnóstico.

Sempre ao lado do marido, Adriana enfrentou a insuficiência renal devido ao lúpus

“Eu passei por diversos médicos até que eu fui parar no Hospital João Alves. E foi lá que um estagiário de dermatologia diagnosticou a minha doença pela primeira vez. Antes de ir para lá, ninguém sabia o que eu tinha, médicos me diagnosticaram de forma errada e isso agravava o meu quadro. Até que esse estagiário me olhou e perguntou se eu tinha lúpus”, lembra.

Naquele dia, os exames comprovaram que Adriana tinha lúpus e seus rins não funcionavam mais, e, por isso, ela estava tão inchada. Adriana fez hemodiálise durante seis anos em um hospital de Aracaju, mas, devido ao lúpus e ao próprio tratamento, ela chegou a pesar 32 quilos.
Somente em 2016, mesmo com seus médicos não acreditando no sucesso do transplante, Adriana foi para São Paulo entrou na lista de espera para realizar o transplante. Apta a receber o órgão, mas sem um doador vivo que lhe doasse o órgão, Adriana foi para Hospital do Rim de São Paulo onde finalmente foi transplantada em agosto de 2017.

“Eu sofri durante anos e muitos não queriam me dar o relatório para que eu pudesse entrar na fila para o transplante. Eu sou a dona da minha vida e se eu tivesse que morrer, seria eu. E eu precisava arriscar”, lembra.

Hoje, ela conta que aprendeu a viver um dia de cada vez e a dar valor a cada um deles. “Hoje, tem um ano e sete meses que sou transplantada. Não tenho mais hemorragias nem crises de lúpus. É claro que, como todo portador de insuficiência renal, as vezes eu não acordo tão disposta, mas do lúpus eu não sinto mais nada”, comemora.

Viagens a São Paulo

Como Sergipe não está autorizado a realizar transplantes de rim – que é a maior demanda no estado -, muitos pacientes são obrigados a se deslocarem para São Paulo para que possam realizar acompanhamento pós-transplante e a, sobretudo, a cirurgia. No entanto, quem já enfrentou esses desafios comenta que “sem ter condições financeiras, não se faz” o transplante, mesmo o governo sendo obrigado a pagar os custos com as passagens de avião e dando uma ajuda diária de R$ 24,75 por pessoa.

“Eles são obrigados por lei a pagarem as passagens, mas a ajuda que eles dão é de R$24,75 por dia para cada pessoa, mas nos dias que você ficar internado apenas o acompanhante recebe e ela só vai entrar bem depois. São Paulo é caro, só a passagem de ônibus é R$ 4,30, sem falar que muitos não conhecem a cidade e se perdem”, comenta Davy.

Davy alerta que, antes de ir para São Paulo em busca de tratamento, os pacientes e suas famílias precisam se preparar financeiramente também. Fazendo uma reserva de pelo menos R$ 2 mil para cada mês que o transplantado ficará lá, e são no mínimo três. Além das consultas e exames pós-transplante. Frequência de viagem varia de acordo com cada paciente, assim como o tempo de permanência.

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