A administração de cemitérios públicos cabe aos municípios e não pode ocorrer a cobrança de taxas por terceiros para a execução dos serviços. Na prática, contudo, a realidade tem sido bem diferente. Pelo menos em Aracaju. No Cemitério São João Batista, no bairro Ponto Novo, bem pertinho da sede da prefeitura, o dinheiro corre frouxo e ninguém impede a negociata para se cuidar dos túmulos dos mortos.
No logradouro se instalou verdadeira “sefazinha”, espécie de Secretaria da Fazenda para arrecadar recursos, tendo à frente o servidor da Emsurb identificado por José Messias, que se identifica como supervisor do cemitério.
O CINFORM investigou denúncias de corrupção que teriam sido praticadas pelo servidor público e conversou com parentes dos sepultados, bem como com o gestor do cemitério. A prática ilegal de negociação para reforma de túmulos e catacumbas afronta a legislação e fere a boa-fé dos contribuintes. O servidor da Emsurb foi delatado pelo colega de trabalho Ezequiel, por cobrar preços altos aos proprietários de catacumbas para facilitar a reforma dos mausoléus e tumbas. Messias negou a acusação, mas disse que tem aceitado agrados
A reportagem do CINFORM se apresentou interessada em reformar um túmulo e foi alertada que deveria pagar determinado valor ao Messias, a fim de conseguir realizar a obra. “Prepare seu coraçãozinho”, disse Ezequiel, que transitava pelo cemitério com um carrinho de mão para atender a uma das “clientes” de Messias.
Enquanto se dirigia a ela, Maria, também ouvida pelo CINFORM durante conversa informal, chamou a repórter para um local isolado e lá perguntou se Messias, que teria sido apresentada a ela como supervisor do cemitério, já havia passado o preço da transação para a reforma que a jornalista desejava.
A Emsurb informou desconhecer o servidor como supervisor do cemitério, cargo que o próprio Messias se autointitulou.
Já Ezequiel, acreditando ser a repórter do CINFORM uma cliente, a inquiriu perguntando se já havia ocorrido a negociação com Messias. “Você já falou com ele? ”, interrogou. Ele continuou afirmando que o preço depende da obra, que a negociação existe e sempre acontece através de Messias.
Maria, que é cliente certa de Messias – segundo ela mesma afirmou -, se aproximou e disse que para conseguir um serviço rápido era só dar um agrado ao servidor da Emsurb, que poderia ser de R$ 50,00.
“Você oferece o agrado e eu aceito”
Ezequiel contestou a informação que a “cliente” passou à repórter e disse que Messias não negocia com valores baixos. “Com esse valor ele não trabalha. Prepare seu coração e escute o preço que ele vai dar, depois você pede para baixar. Mas R$ 50,00 é pouco”, afirmou o servidor do município.
Messias negou cobrar taxas para reformar os túmulos. Ele atendeu a reportagem do CINFORM acreditando se tratar de mais um cliente. Quando perguntado sobre como apressar a obra, o servidor disse que seria possível ajeitar, mas primeiro era preciso olhar a catacumba e conhecer o problema.
“Eu não cobro porque sou funcionário público. Depois que o proprietário for à Emsurb e tratar das partes legais, aí pode me procurar que eu indico o pedreiro e conversaremos melhor quanto a adiantar da obra. Se me der o agrado eu aceito, é claro”, admitiu o servidor, conforme o áudio postado pelo portal de notícias do CINFORM, que você pode acessar aqui se desejar ouvir a conversação gravada.
Apesar de Messias negar que cobra para promover as reformas, o que, segundo a Emsurb é ilegal e criminoso, Ezequiel, de forma inocente, relatou, junto com a “cliente” Maria, como se processariam as negociações.
Maria, por sua vez, disse que Messias é quem resolve tudo no cemitério e que sempre o procura para reformar ou ajeitar o túmulo do filho. “Ele arranja o pedreiro e, além disso, você vai escondido e bota um agrado na mão dele. Ai tudo anda. De outra forma não”, advertiu a mulher.
Ela acrescentou que se a obra for maior é melhor dar R$ 100,00. A informação é constatada por Ezequiel, que reafirmou ser alto o preço cobrado por Messias. “Se preparem para quando Messias der o valor, aí vocês dizem: Messias só posso dar menos. Pode ser que ele aceite”, informou Ezequiel.
EMSURB
A direção da Emsurb informou que tanto é crime de quem paga ao servidor público para realizar serviços quanto é criminoso o ato do servidor cobrar para efetuar melhorias nas catacumbas. A empresa deixa claro que o servidor que ali exerce suas funções já recebe seu salário, não havendo justificativa para que receba taxas extras e ilegais.
Além disso, a direção da Emsurb deixou claro que a manutenção das sepulturas é feita pelas famílias e que se as sepulturas forem abandonadas serão confiscadas pela Emsurb.
O serviço de limpeza é obrigatório por parte dos proprietários e, para que sejam realizadas reformas ou qualquer outro procedimento nas catacumbas, não se permite a cobrança de taxas por parte dos servidores que atuam no cemitério.
Segundo a empresa, a atividade de cobrança de taxa ilegal configuraria, de acordo com o artigo 317 do Código Penal, crime de corrupção passiva, enunciado como “solicitar ou receber, para si ou para outros, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.”