A tentativa de golpe ocorrida no último 8 de janeiro ficará registrado na parte mais macabra do período republicano de nosso país. A invasão e depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e da sede do Supremo Tribunal Federal (STF), além do milionário prejuízo financeiro e da incalculável destruição simbólica, materializou o desejo da horda bolsonarista em manter-se no poder, totalmente a revelia da ordem constitucional e vontade da maioria da população brasileira que foi revelada pelas urnas.

Há quem afirme que o episódio guarde similaridade com a invasão ao Capitólio, ocorrida durante a posse do atual presidente dos EUA, John Biden. Na ocasião, apoiadores do ex-presidente Donald Trump, entre eles o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), invadiram um dos edifícios mais simbólicos da democracia estadunidense, em uma tentativa de impedir a posse do chefe do executivo nacional.

Marx, no livro 18 de Brumário de Luís Bonaparte, escreve que a história acontece primeiro como tragédia e depois se repete como farsa. A interpretação da irônica frase do autor de O Capital aponta que os seres humanos não constroem a história de acordo com a própria vontade, pelo contrário, agem de acordo com determinados limites impostos pela realidade dos fatos.

Faço este pequeno preâmbulo para afirmar que a tentativa de golpe só aconteceu devido ao contexto que foi sendo cristalizado ao longo dos últimos anos. As investigações realizadas até o momento apontam a conivência ou omissão do governo do Distrito Federal e das Forças Armadas, que ficaram paralisadas diante da invasão da sede dos três poderes.

Estão sendo reveladas também uma cadeia de financiamento que envolve pecuaristas, grileiros de terra e empresários que atuam em diversos setores da economia. A IBOVESPA, principal bolsa de valores do país, por exemplo, fechou em alta no primeiro dia útil após a tentativa de golpe, o que pode revelar seu apreço aos valores democráticos e republicanos.

Entretanto, faço uma digressão para tentar justificar que o “Capitólio tupiniquim” foi construído ao longo de todo mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Quando o ex-presidente andava de moto sem capacete, desrespeitando o Código de Trânsito, e nenhum órgão o autuou;

Quando o ex-presidente utilizava a Polícia Federal para encobrir as investigações em andamento contra seus filhos e aliados políticos e nenhum órgão o reprimiu;

Quando o ex-presidente fazia piadinha com as vítimas fatais de COVID-19 e nenhum órgão o enquadrou e/ou imputou a alcunha de negacionista;

Quando o ex-presidente desrespeitou todo o arcabouço legal que regulamenta o orçamento público e nenhum órgão ou mesmo o “temido” Mercado o denominou de mau gestor ou governo sem responsabilidade fiscal;

Quando o ex-presidente dirigia-se aos seus apoiadores com palavras de ordem contra a democracia e as instituições republicanas e nenhum órgão colocava o limite da Constituição Federal, que ele nunca respeitou plenamente.

Com base nesses exemplos, pode-se afirmar que o ex-presidente sempre agiu fora das margens do Estado Moderno. Para ele, o que sempre prevaleceu foi a condição humana no hipotético estado de guerra, o princípio de que o indivíduo é uma espécie dotada de poderes absolutos e soberano de tal modo não pactuar valores com outros indivíduos.

A tentativa de golpe que vimos no último 8 de janeiro, portanto, representa mais uma expressão do que tem sido chamado de bolsonarismo, movimento que é, sob meu ponto de vista, ideologicamente protofascista, moralmente reacionário, economicamente ultraliberal e culturalmente cafona.

Em outros termos, o bolsonarismo guia-se por uma epistemologia que é bem distinta da predominante na cultura ocidental, marcada por valores liberais (liberdade, igualdade, tolerância, direitos sociais, etc), e que são pautados dentro do marco democrático e civilizatório. O bolsonarismo não é um distúrbio psicológico ou uma patologia. Com forte poder messiânico, continuará mobilizando brasileiros nos próximos anos.

O bolsonarismo é uma expressão do cenário político contemporâneo que ultrapassa a existência do próprio Jair Bolsonaro (PL) e dos seus filhos ou aliados mais próximos. Se você tem dúvida do que estou afirmando, olhe para o que está acontecendo nos EUA ou na Europa.

Os teóricos críticos deixaram como legado a perspectiva de analisar a realidade a partir de suas diversas facetas, ou seja, de modo interdisciplinar. A análise social, portanto, considera fatores múltiplos, muito embora seja composto por um movimento histórico onde nem sempre há progresso e emancipação. Auschwitz e a bomba atômica talvez sejam as melhores expressões da barbárie criada pelos próprios homens.

Em um de seus textos, Adorno deixou um recado que julgo importante para os dias atuais: é preciso criar as condições para evitar que os sintomas da barbárie sejam instalados em uma sociedade democrática. Para ele, é preciso evitar que a experiência de Auschwitz se repita.

Portanto, a tarefa número um da educação e da instituição escola é colaborem para a jornada humana em direção à emancipação. Evitar que a barbárie bolsonarista se repita em nosso país, eis a tarefa principal da educação nos dias atuais.

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