“Viver é luxo” é uma das últimas sentenças de Clarice Lispector no livro e obra de arte ‘A hora da estrela’. A fatídica narrativa de enfrentamento com a morte pelo ex-prefeito de São Paulo, Bruno Covas, leva a sociedade a refletir sobre um tema de expansão da consciência: a empatia. 
 
O economista e advogado faleceu no último dia 16 de maio, mas antes, fez valer o seu direito de se despedir dos que mais ama. Diante de críticas severas por ter ido com o filho ao estádio de futebol, no RJ, em um contexto de pandemia, fica agora a questão sobre a ética de se fazer política, mas principalmente, do que vem a ser empatia.
 
Listada como uma das 24 forças de caráter, a empatia é considerada uma competência e habilidade social indispensável nas relações, sejam elas profissionais ou pessoais. Na Psicologia Positiva, seara de pesquisa e intervenções testadas pelos psicólogos Martin Seligman e Christofer Peterson, a empatia pertence ao grupo de virtudes classificada como ‘Humanidade’. 
 
Para a coordenadora pedagógica do curso de Psicologia da Faculdade São Luís de França, Marcela Teti, ter empatia por outra pessoa é entender que duas pessoas são completamente diferentes e cada uma carrega seu conjunto de verdades, valores e princípios. “A minha verdade não é a verdade do outro. Nascemos em bairros, cidades, países distintos, nossas religiões, famílias, empregos, salários e nossa história de vida são diferentes. Ter empatia, portanto, é saber se colocar no mundo do outro e enxergar os problemas dele com os “óculos” dele. Não adianta ouvir os problemas da outra pessoa e julgá-lo, aconselhá-lo com sua verdade”, pontua a psicóloga.
Há como desenvolver a empatia?
 
Marcela Teti afirma que sim. A resposta está no exercício de sair constantemente de dentro de si. “O único jeito de ser empático é sentir a realidade como o outro sente e propor soluções a partir dos instrumentos de que o outro dispõe”, contextualiza Teti.
 A empatia é considerada atualmente uma das mais sofisticadas habilidades. A diversidade ocasionada pela globalização e as migrações, bem como a internacionalização do mercado, traz uma realidade de estarmos cada vez mais próximos de pessoas que têm vidas e experiências distintas das nossas, seja na vizinhança ou no trabalho.
É importante refletir: “para que uma empresa ou uma comunidade cresça é preciso compreender, desenvolver compaixão, ser solidário, trabalhar junto em torno de um objetivo que beneficie a todos. Empatia é preponderante numa empresa, mas também no casamento, na família. Se alguém não consegue fazer o que eu acho importante, talvez eu deva rever o que é importante de fato”, questiona Marcela.
 
A mensagem do que somos – muito além de títulos e funções que executamos, pois isso é circunstancial – encontra-se justamente na expansão das forças de caráter. Bruno, com sobrenome tradicional na política brasileira, não se curvou aos julgamentos e convenções alheias. Foi, é e será um pai memorável até (o fim?) ou até onde as histórias afetivas de um filho alcançarem. 
 
O comportamento humano é função de uma pessoa, mas também depende do contexto em que está inserido. Vivemos em uma pandemia, com instabilidades emocionais e econômicas crescentes. 
Quais posturas e critérios adotar desde já?
A primeira coisa que é importante pontuar é reconhecer em quais áreas da vida não se vai bem. “Avalie se está sofrendo por qualquer razão e que precisa talvez de descanso, de uma autopremiação, de algo que te faça feliz. Em seguida é importante reconhecer que as pessoas ao seu redor também estão sofrendo, por razões iguais às suas ou distintas. É que como você, elas precisam de apoio, ajuda, reconhecimentos, algo que as deixem felizes”, sinaliza Teti.

O budismo afirma que “A vida é um sofrimento” e a psicóloga enfoca que “nosso papel na existência é fazer com que todos os dias valham a pena viver”. Ter esta compreensão em mente no cotidiano auxilia a se engajar no que realmente é importante para a própria vida e para quem lhe rodeia.

Marcela ainda afirma que neste atual cenário de pandemia é imprescindível deixar de ter razão e permanecer no espaço do erro. “Só assim será possível construir novas verdades coletivas que tragam mais sentido para a vida das pessoas. E eu espero que sejam verdades fundadas no convívio com o outro, no respeito às pessoas mais velhas, à família, no auxílio às crianças, e numa educação cada vez mais voltada às necessidades atuais e não aos baluartes da história. Que nós tenhamos coragem de esquecer um passado sem sentido e valorizarmos cada vez mais o presente e a História que está por se construir”, conclui a Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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