Por Suyene Correia

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A cineasta sergipana Jade Moraes lançou, na última quarta-feira, no Centro Cultural de Aracaju, seu primeiro curta-metragem de ficção “Olhos de Fogo”, livremente baseado no conto homônimo do escritor Antônio Carlos Viana. Acostumada com a linguagem documental, tendo realizado produções para TV, como “Candelária- Aquela Que a Luz Conduz” sobre Maria Niziana Castelino, a ex-profissional do sexo, mais conhecida como Candelária e o curta “Aracajoubert” sobre seu pai, o artista plástico, Joubert Moraes, a diretora decidiu arriscar-se na ficção, assim que teve contato com a obra de Viana.

“Os contos de Antônio Carlos Viana são totalmente imagéticos e já inspiraram alguns filmes e muitas teses. ‘Olhos de Fogo’ foi uma paixão à primeira lida. Encontrei-o no livro “Em Pleno Castigo” que descobri na casa de papai e quando o li, fiquei tão intrigada, que queria colocar tudo aquilo na tela grande, transformar aquela história num filme. Um conto num curta”, explica Moraes.

Se o diretor paraibano Marcus Vilar teve a oportunidade de adaptar para as telas, os contos de Viana ‘O Meio do Mundo’ e ‘O Terceiro Velho da Noite’, Jade Moraes não perdeu a chance de filmar a história de ‘Olhos de Fogo’, recebendo prontamente o aval do autor. Produzido pela Monólito Filmes com coprodução da Lamparina Animação e Produção de Vídeos Ltda., o curta trata da questão do abuso sexual e da conivência familiar, a partir da história da jovem Maria- muito bem interpretada por Jaque Barroso- alertando para as consequências do silêncio que se instala entre os familiares.

O elenco conta ainda com a tarimbada atriz de teatro, Isabel Santos, que interpreta a personagem Tereza, mãe de Maria e Cícero Alberto, como o pai, Zé. Numa breve cena em flashback, a atriz mirim Maria Clara Barbosa interpreta Maria, quando criança.

“Olhos de Fogo” começou a ser vislumbrado como produto audiovisual quando o projeto foi um dos vencedores do Prêmio Wilson Silva de Incentivo à Produção de Obras Audiovisuais Digitais de Curta e Média Metragem concedido pela Secretaria de Estado da Cultura (Secult) em 2014, com a parceria da Agência Nacional do Cinema (Ancine) através do programa Brasil de Todas as Telas.

“Em 2015, saiu 1/3 do dinheiro pago pela Secult, oriundo do Fundo Estadual de Desenvolvimento Cultural e Artístico (Funcart) e, somente em 2017, foram pagos os 2/3 restantes, através do Fundo Setorial do Audiovisual. O valor recebido foi de R$ 46.666,00 mil reais que é uma verba apertada para fazer ficção, mas tivemos uma parceria incrível com a Lamparina, que assinou a coprodução e viabilizou toda a infraestrutura de equipamento e parte da equipe”, diz a diretora.

A pré-produção do curta-metragem contou com dois momentos bem distintos: o primeiro, quando parte inicial do orçamento foi liberado pela Secult e o outro, dois anos depois, com a complementação do pagamento. Nesse ínterim, a diretora teve que lidar com alguns percalços. “Incialmente, pensei em escalar uma atriz para o papel principal, mas ela foi morar na Argentina e tive que escolher outra protagonista. Outro problema foi com a locação que tinha escolhido previamente, durante um curso de direção de arte com a Lia Renha, mas que já não iria poder utilizar na época das filmagens. Tivemos que começar do zero, mas foi rápido para conseguir as novas locações, parcerias e até mesmo a liberação do Arcebispo para gravarmos no convento em São Cristóvão”, conta.

Sobre a experiência em estrear dirigindo uma ficção, Jade Moraes revela: “eu amei dirigir ficção, profissionalmente, falando, já que nos tempos da Universidade, chegamos a produzir alguns curtas, num projeto da Rede Olhar Brasil. Na TV Brasil, também dirigi, produzi e editei uns curtas, mas tudo sem verba. Adorei dirigir atores, chegar no timing, na emoção que eu queria que fosse passado naquela cena. No documentário, quando estou entrevistando, foco no personagem, olho diretamente para ele e não para o monitor. Já na ficção, o que importa é como a cena está saindo no vídeo. É outra percepção”, finaliza.

Há pontos a serem elogiados e outros criticados no filme “Olhos de Fogo”. A escalação do elenco feminino está bastante afiada. Ainda que Jaque Barroso, em alguns momentos, exagere no tom, após sua personagem relembrar da violência, da qual foi vítima, impressiona seu desempenho no terço final, próximo do clímax. Isabel Santos, mesmo em silêncio o filme inteiro, deixa claro o sentimento que Tereza nutre pela filha, a partir do momento que, involuntariamente, ela se torna sua rival.

Se nos primeiros minutos de projeção, a montagem parece “atropelar” a narrativa, tentando dar conta do presente e do passado da protagonista, num espaço de tempo exíguo, prejudicando uma boa fruição da história, não tarda para que o ritmo equilibrado da narrativa seja alcançado, sobretudo através de match cuts muito bem idealizados, como a cena em que o pai puxa o lençol da filha pequena, enquanto ela dorme e, na sequência, vemos Maria adulta, esticando o lençol para lavá-lo no rio.

Destaque também para a fotografia assinada por Ícaro Mendonça; o figurino que ficou a cargo de Adjania Nunes e a produção de arte de Marcelo Rodrigo que trabalharam duro para que as filmagens fossem finalizadas em quatro dias, entre Aracaju e São Cristóvão. Porém, há que se apontar para algumas escolhas que não funcionaram a contento, a exemplo do Zé, criado por Cícero Alberto. O personagem é o estereótipo do homem interiorano, arrogante e abusivo com as mulheres. Falta-lhe densidade, talvez, até uma dose de cinismo e desejo estampado no rosto.

A captação do som direto também apresenta problemas em algumas sequências, deixando o espectador na dúvida sobre palavras proferidas por Maria. Já a escolha da voice over da protagonista, como condutora da narrativa, em algumas ocasiões gera, para o espectador, redundância desnecessária.

Agora, após a sessão de estreia no Núcleo de Produção Digital Orlando Vieira, a diretora e roteirista pretende emplacar o curta em outros festivais.

Crédito da Foto: Melissa Warwick

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